As medidas apresentadas pelo governo para ajudar micro, pequenas e médias empresas na crise do coronavírus são positivas, mas a demora para o lançamento dos programas e o excesso de regras para aprovação dos empréstimos estão travando a liberação de recursos, dizem instituições financeiras. A solução foi tão lenta que as empresas entraram no vermelho e já não conseguem crédito porque estão com o “nome sujo”.
Entre as medidas anunciadas pelo governo para evitar que empresas quebrem por falta de vendas durante o isolamento social para conter a covid-19, estão R$ 40 bilhões para pagamento de salários e R$ 15,9 bilhões para capital de giro. Mas os recursos simplesmente não estão chegando a quem precisa, dizem os empreendedores.
“Os programas são bons, mas estão andando devagar demais. Faz dois meses que anunciaram recursos públicos para crédito”, afirma o presidente da ABCD (Associação Brasileira do Crédito Digital), Rafael Pereira, que representa bancos digitais e fintechs de crédito.
Atraso suja nome das empresas, e isso vira um círculo vicioso
O atraso na aprovação das medidas pelo governo cria um problema, diz o setor financeiro. Com a demora na liberação de recursos por parte do governo, mais empresas ficaram em atraso com pagamentos. Elas ficam com o “nome sujo” e não conseguem crédito por isso. Como as instituições financeiras precisam fazer análise de crédito antes de liberar os recursos, os empresários com restrição não estão conseguindo passar nem primeira análise. Segundo a Serasa Experian, há mais de 5,3 milhões de empresas com apontamento restritivo.
Quem vai pagar o custo da operação?
Rafael Pereira também diz que há “muita interferência nas condições de financiamento”. Ele cita o caso do tabelamento de juros, de 4,25% ao ano, nas linhas de crédito para micro e pequenas empresas, sancionadas nesta semana. Pereira diz que, apesar de a maior parte dos recursos ser dinheiro público (85% de cada empréstimo é do governo e 15% da instituição financeira) e de haver uma garantia, dada pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), a liberação do empréstimo tem custos e riscos para quem entra como intermediador da operação.
“Qual empresa vai emprestar a 4,25%? Como pagar o custo operacional, que é de quem concede crédito? E se não receber? Vai executar o fundo garantidor? Isso tudo tem custo e risco”, diz o presidente da ABCD. Para ele, as instituições financeiras estariam mais ativas nessa operação se o mercado pudesse definir as taxas para recuperar ao menos o custo da operação. “A concorrência iria funcionar. Mas parece que o modelo foi criado pelo governo para só os bancos públicos fazerem essas linhas”.
“Além da capilaridade, de poder checar a mais microempreendedores, as fintechs também são mais ágeis para aprovar e conceder crédito”, afirma o diretor executivo da ABFintechs (Associação Brasileira de Fintechs), Diego Perez, também sócio da plataforma de crowdfunding de Investimentos SMU.
Ampliar leque para fintechs
Representantes de fintechs dizem ainda que nem todas empresas financeiras digitais estão autorizadas pelo Banco Central a operar na distribuição de crédito com recursos públicos. Apenas podem atuar as fintechs constituídas como SEPs (Sociedade de Empréstimo Entre Pessoas) e as SDCs (Sociedade de Crédito Direto).
“O universo de SEPs e SDCs é de pouco mais de uma dezena de instituições contra centenas de fintechs espalhadas pelo Brasil. A consequência disso é que a capilaridade que as fintechs podem oferecer, chegando ao usuário por meio tecnológico em aplicativo de celular e site, por exemplo, ficou restrita”, diz Elber Fabrício Laranja, cofundador da fintech de crédito Antecipa Fácil e membro da ABFintech (Associação Brasileira de Fintechs).
Ajudar a vender
Apesar dos empecilhos, as fintechs estão prontas para ampliar a oferta de crédito e levar mais recursos públicos a micro e pequenos empresários, dizem representantes do setor, dando exemplos. Elas já atuam como repassadoras do auxílio emergencial e de programas de outros recursos públicos aos mais necessitados.
O PagSeguro PagBank, por exemplo, foi escolhido pelo governo de Minas Gerais para ser a conta digital de distribuição do auxílio ‘bolsa-merenda’, que será pago em quatro parcelas mensais de R$ 50 para mais de 275 mil famílias carentes. A empresa vai depositar R$ 20 extras ao benefício para os que optarem por receber pela conta digital.
Com 5,3 milhões de vendedores ativos, o PagSeguro PagBank também colocou o llink de pagamento para que os clientes possam vender através de redes sociais, email e WhatsApp e uma plataforma para os vendedores poderem comercializar produtos e serviços online.
Dinheiro na mão das pessoas
A Dotz, plataforma de relacionamento e fidelidade, também lançou a segunda geração de negócios da companhia, a Dotz Nova Geração, com conta digital para que empreendedores em todo o país possam movimentar recursos, pagar e receber contas, além de trocar pontos de fidelidade por dinheiro.
Com quase 40 milhões de usuários, a Dotz colocou sua plataforma de negócios para que empreendedores também possam fazer vendas online. “Nossa proposta de valor é colocar mais dinheiro no bolso das pessoas nesse período de crise”, disse o presidente da Dotz, Roberto Chade.
Na Nexoos, fintech que oferta crédito, ligando, de um lado investidores com recursos para emprestar, e de outro, empresários que precisam tomar empréstimos, lançou uma plataforma para que as empresas que não têm acesso a crédito, nem operação digital ou suporte para pagamento online, possam anunciar e vender produtos e serviços na internet. “Queremos disponibilizar a estrutura que temos para ajudar o pequeno empreendedor a sobreviver a esta crise”, disse Diego Gomes, CEO da Nexoos.
Fonte: UOL